quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Estereótipos, preconceitos e tolices no mundo rock


Quando comecei esse blog a um pouco mais de seis anos atrás, a primeira matéria foi "O Impagável Anti-Rock", texto de Maurício Gomes Angelo pro Whiplash. Curioso que tal texto mostrava claramente como o atraso de pensamento e o preconceito claro de pessoas que não curtem um estilo e lhes atribui o mal (na realidade, dentro do mundo dito cristão esse pensamento notavelmente gnóstico de separação entre a "maligna" matéria e o "santo" espiritual é ainda muito comum e tá tão entranhado que até assusta como inadvertidamente uma quantidade gigantesca de cristãos são hereges sem nem perceber). Motivações as mais diversas existem para esse ódio inconsequente e irracional pelo rock (bem como por outros estilos como os brasileiros funk carioca e tecnobrega - que, frise-se, eu não curto e tenho até ojeriza pelos estilos em si, mas a muito tempo sei que o mal não está nesses ritmos e que as pessoas têm direito de curtir o que quiserem!), e algumas dessas motivações advém da origem negra, proletária e marginal do estilo, ou da religiosidade estúpida mesmo. Mas há casos que espantam por mostrarem-se frutos de ignorância descabida, estereotipação ou pior, conspiracionismo retardado. Nos anos 1950 não era incomum alguns americanos dizerem que o rock era criação dos sovietes para destruir a juventude cristã norte-americana - em contrapartida do outro lado da Cortina de Ferro os comunistas denunciavam como o rock chegava para apregoar o "american way of life" e destruir o sistema marxista-leninista-stalinista em que viviam. Nos tempos de Guerra Fria essas ilações ridículas até fariam sentido. Mas em pleno 2019 somos obrigados a ver isso (extraído do canal O Globo porque me recuso a dar view pro canal de origem), partindo de um MAESTRO formado em música clássica (que eu amo de paixão tanto quanto amo rock e nem por isso discrimino um ou o outro) e que, acredite, foi colocado como novo presidente da Funarte (uma repartição do Ministério da Cidadania no Brasil responsável por políticas públicas para fortalecer TODAS formas artísticas do Brasil). Veja o que esse senhor foi capaz de dizer, em pleno 2019!



É assustador não? Mas é preciso perceber que mentecaptos do governo atual (OBS: Se você apoia esse atual governo isso não é problema meu e nem quero aqui criar revanchismo, cada um acredita no que quer, seja Papai Noel, Zeus ou Olavo de Carvalho) são apenas um dos muitos lugares onde o estereótipo do rock existe, em especial no Brasil.

Por exemplo, em 1982 rolou o festival "O Começo do Fim do Mundo" no SESC de Pompéia, SP, unindo por dois dias as duas maiores facções do punk paulistano: os paulistas (da cidade de SP) e os do ABC. A união um tanto frágil e tensa gerou alguns momentos de desentendimento sim, mas por um período grande eles foram "um só povo". Daí as forças policiais instigadas por governantes estúpidos e ignorantes dos tempos ditatoriais no Brasil decidiram por fim em tudo aquilo na base do cassetete. Lamentável, sem dúvidas. Mas ainda pior é o que a mídia reservava. A "repórter" Silvia Poppovic mostrou os punks como baderneiros idiotas e sem futuro algum, praticamente justificando a ação policial (a mesma Silvia anos mais tarde foi criticada sem dó nem piedade ao atacar a instituição policial quando de ações nas favelas de RJ - o que em partes eu concordo com ela, porém é uma disparidade de discurso tão grande quanto a de Rachel Sherazade que anos atrás dizia que "quem tinha pena de bandido que leve pra casa" numa matéria em que o povo amarrou um marginal no poste e o espancou, porém atualmente diz que NUNCA defendeu excessos nem torturas...).

Nem preciso dizer o quanto a Rede Globo prestou um desserviço a todos os headbangers, metallers e metalheads ao criar o termo "metaleiro" e criar o estereótipo de "metaleiro" como um "vida louca" qualquer e que odiava todos os outros estilos (OK OK, verdade seja dita, muitos bangers que foram pro Rock in Rio em 1985 agiram de maneira estúpida - e muitos continuaram em edições posteriores do evento -, mas isso era basicamente uma parte apenas da turma, e acabou criando uma falsa ideia que se espalhou do "headbanger tr00" que sua vida é metal e nada mais).



Não é a toa que anos mais tarde apareceriam cretinos tão fanáticos e estúpidos quanto os fãs retardados de grupos pop dentro do cenário metal. Pois é... a paródia feita no Programa Legal em 1991 acabou virando uma realidade incontestável devido a muitos que caíram na armadilha do estereótipo construído no Rock in Rio seis anos antes...

Entre os anos de 1992/93 a Globo exibia a novela De Corpo e Alma. Nessa novela de Glória Perez vieram, como é de praxe nas novelas dela, uma quantidade significativa de temas, como doação de órgãos, inversão de papeis entre homens e mulheres, boates de striptease masculinos e, após o assassinato de sua filha Daniela Perez (que atuava na novela curiosamente com o assassino dela na vida real do lado) a morosidade da justiça e nosso código penal ultrapassado (aliás, isso ainda é uma temática tão atual e terrível!). Entretanto a autora foi extremamente desajeitada ao incluir um personagem "gótico" como Reginaldo Freitas (interpretado por Eri Johnson). O personagem tinha um visual muito forçado e seu modo de viver, agir e pensar era no máximo uma paródia de mau gosto do movimento gótico. Infelizmente esse tornou-se a forma que muitos enxergam os góticos até hoje, como pessoas depressivas, aversas à vida e isoladas de tudo e todos, que vivem em cemitérios fazendo rituais e - pasmem, há quem creia nisso mesmo - praticando atos de vampirismo e licantropia!






(OBS: Apesar disso, uma lástima a Daniela ter morrido em meio a trama - ainda mais da maneira que foi. Teria sido interessante ver o desenvolvimento desse possível romance entre os dois).

A percepção canhestra do que é o movimento gótico é tão perceptível por parte da produção da novela e da Globo que a capa da trilha sonora internacional da novela tem o Reginaldo, porém NENHUMA MÚSICA de gótico internacional, de quaisquer vertentes que sejam. Pra você ter uma ideia, a música do personagem é "Fora de Ordem" de Caetano Veloso (que saiu na trilha sonora nacional que - grande surpresa! - não tem nenhuma música gótica nacional também), um MPB que meio que insinua que o personagem realmente é um deslocado fora de ordem... tradução do movimento nível zero absoluto!

Teve espaço pra Richard Marx, mas não pra The Cure ou Siouxie and Banshees, que que
esses produtores andam fumando? (OBS: Eu tenho original esse LP kkkk)

Esses são apenas alguns exemplos do que a mídia deslocada e ignorante BR faz. Isso sem falar de casos de "críticos musicais" a lá Flávio Cavalcanti que em revistas como a Veja e outras detonavam o rock como "música pobre" e "elogios" similares. Essas bobalhadas todas que até hoje dominam a mente e o imaginário dos que não curtem o gênero não por achar ele barulhento e panz, mas pelo preconceito e ignorância imbecis. Mas nada supera "Estrela-Guia" (2001), uma novela bem mequetrefe (com apenas três meses de duração, unicamente pra pegar carona no sucesso da cantora pop Sandy e seu irmão Junior na época) e inserido de maneira bem ridícula as comunidades hippies que ainda persistem no Brasil. Realmente ridículo! Ou a reportagem do Fantástico sobre os emos, lembra dessa merda? Quantos até hoje acham que emocores são todos assim?

Mas sabe o pior? É que algumas dessas tabaquices acabaram contaminando de fato o mundo do rock. Vide os "Rock Wins" da vida. Quando essa página era grande no Facebook, viviam como verdadeiros "caga-regras" do rock, caçando quem curtia outros gêneros e até mesmo os chamando de posers pra baixo. Curioso que essa geração "Rock Wins" é uma das que realmente menos contribuíram e menos contribuem até hoje pro rock. A maioria dessa turma nem de rock gosta mais hoje em dia e muitos aí não iam nem pra show do Restart (só pra citar uma das mais comerciais - e chatas, na minha opinião - bandas do rock nacional), quanto mais shows de outros gêneros. Infelizmente a mentalidade Rock Wins contaminou até o cenário dito "gospel", vide tantos "roqueiros de uma banda só" como os oficináticos, panheads, catedráticos, rosarianos e seja lá que babação a uma banda você faça. Muitos desses chegam ao ponto esdrúxulo de achar suas bandas não só "as melhores" (o que as pessoas tem até o direito de achar, tudo bem né) como também de ignorar por completo o trabalho de outros músicos do rock cristão e até classificar como "ruim" (pffff...). Há também a tropa dos tr00s crentes, que só ouvem "underground" e acham que qualquer som que faça sucesso é "modinha" e "puro som gospel mercadológico de quinta" (me envergonha admitir que já fui sim partidário dessa tropa cretina!). Essas babaquices que remetem os tempos que os punks vs. bangers ou góticos vs. o resto do rock ou black metal (e bangers não-cristãos em geral) vs. "white metal" (essa treta ainda infelizmente é real e estúpida) reinavam absolutas. Essas picuinhas ajudam a aumentar ainda mais os estereótipos de quem já tá predisposto a odiar o gênero, e quando essas advém de ditos "roqueiros cristãos" isso torna as coisas ainda mais trágicas.

Existem um monte de situações que parecem tanto complicadas que eu vejo no universo do rock. A primeira questão é as já citadas divisões estúpidas entre as vertentes. Mas há outras. A rixa exagerada contra outros estilos fora do rock, aquela bobalhada a lá Edu Falaschi de "paga-pau de gringo" (embora de fato eu seja meio chato com os "fãs" que só vão pra show de banda de fora, eu devo salientar que por vezes as bandas locais e produtoras também pecam feio em achar que show underground tem que ser "de todo jeito", quando a parada não é e nem nunca devia ter sido essa, ainda mais em pleno século XXI!), os "roqueiros de uma banda só", a turminha que não vai a um show, nunca compra um CD ou camisa oficial, nunca nem foi no Spotify, Deezer, Bandcamp ou canal oficial do Youtube ou Youtube Topic de uma banda, mas se acham no direito de baixar e compartilhar mp3 ilegal e comprar camisas piratas, a trupe do rock cristão que acha que por ser roqueiro precisa de agir exatamente igual aos outros (e aí fazendo coisas que não agradam a Deus em nome do lema "Sexo, Drogas e Rock'n'Roll"), entre tantas outras atitudes que são aceitáveis quando somos meninos, mas não podemos permanecer na meninice pra sempre, temos de evoluir (I Coríntios 13:11). Sim, embora seja um texto geral pra todo mundo do rock, os cristãos também precisam dessa ênfase, afinal como esperamos mostrar que fazemos música de qualidade, liberdade verdadeira e fiéis ao que cremos quando não somos capazes de realmente ser luz para o resto do rock, senão motivo de zombaria não por sermos cristãos, mas por nos perdemos em picuinhas como ideologias, politicagens, imitações baratas ou shows de péssima qualidade ou pura e simplesmente voltados pra proselitagem barata. Podemos ir muito além, basta termos a certeza do que cremos, em Quem confiamos e não esmorecermos.

God bless rock'n'roll!





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