sábado, 15 de dezembro de 2018

Origem do rock cristão e subgêneros - Parte III

Sim, eu sei bem que demorou pra sair, mas enfim a parte III e última da série "origem do rock cristão e subgêneros". Apesar de ser a última, ainda pretendo depois fazer um spin-off sobre a origem do rock cristão brasileiro também. Mas aqui falaremos sobre os subgêneros do metal cristão e também sobre o goticismo.

Goticismo


Muitos incautos atribuem ao goticismo a imagem de pessoas depressivas, satanistas, ocultistas, de seres que vez por outra aparecem em produções estúpidas do universo da mídia, como aquele "gótico" da novela "De Corpo e Alma" (1992-93) da Rede Globo. Na realidade nada pode ser mais falso.

O goticismo, ou ao menos o termo "gótico" advém de antes da Idade Média. É atribuído aos povos godos (visigodos e ostrogodos), que estavam entre os considerados "povos bárbaros" que ajudaram a destruir o Império Romano no final da Idade Antiga. Mas, ao contrário do que se pinta sobre que esses povos simplesmente vinham e somente arrasavam tudo (tanto que o nome de um desses povos, "Vândalos", transformou-se em sinônimo pra desordeiro e destruidor), pelo contrário, eles modificaram positivamente a cultura ao seu redor.

Ao longo da Idade Média essas mudanças foram sentidas nas construções de igrejas. O estilo românico, mais horizontal, simples, foi suplantado pelo estilo gótico, com catedrais que desafiavam a gravidade, cada vez mais verticais e afiladas, no intuito de apontar diretamente a Deus. As catedrais de Notre-Dame são exemplo básico dessa beleza ímpar, as quais ainda impressionam até hoje - curiosamente um personagem com traços puramente góticos foi criado tendo como cenário de fundo uma dessas catedrais, "O Corcunda de Notre-Dame".

O termo gótico caiu em desuso no fim da Idade Média com o surgimento do Renascimento, mas no século XIX voltaria a tona, agora saindo do âmbito arquitetônico e passando para o literário, dentro do Romantismo, em especial o que advém da segunda fase do movimento, o Ultrarromantismo. Escritores como Edgar Allan Poe, Mary Shelley, Bram Stoker e Álvares de Azevedo estão entre os principais promotores dessa linha de escrita que traria ao mundo seres como "o Monstro de Frankenstein", "Drácula", os beberrões de "Noite na Taverna", "O Gato", "Dr. Jekkyl e Mr. Hyde", "Macário", entre outros seres fantásticos e que traziam consigo o desespero humano, o medo pelo diferente, os desejos mais vis que corroem a alma, entre outras temáticas que decerto até foram consideradas "malditas" por muitos, mas que inspiram até hoje a música, o cinema e outros meios de mídia, cultura e arte.

Na música o goticismo já dava seus passos desde compositores de música clássica, como Wagner, mas o gênero "Rock Gótico" demoraria para chegar um pouco mais. Alguns precursores como Nico e David Bowie apareceram, mas só em meio ao pós-punk viriam bandas como Bauhaus, Joy Division, New Order, Smiths, The Cure, Siouxie & Banshees, The Cult, Depeche Mode, Christian Death e Dead Can Dance, só pra citar algumas, nas mais diversas subdivisões do gênero (como deathrock, synthpop, new romantic, E.B.M., gothic metal - apesar de muitos góticos rejeitarem a associação com a cena metálica). No cenário nacional não foi diferente, e os pós-punks/góticos/darks tomaram a cena nos anos 1980, com bandas como Arte no Escuro (BSB), Black Future (RJ) e as paulistas filhas da Vanguarda Paulista Patife Band, Cabine C, Mercenárias, Azul 29, Agentss, entre outras.

E sim, não demorou para surgirem bandas cristãs do gênero, afinal o goticismo é ligado à igreja desde as origens, então nada mais natural que surgirem bandas como The Predators, Crowd Control (ambas do Reino Unido), Mad at the World, Lifesavers Underground (L.S.U.), No Longer Music, The Awakening, Virgin Black, Weeding Party, Saviour Machine, Undish, Amos, Days are Nights, Poets Awake (as últimas três brasileiras), entre outras. É um cenário a ser explorado, pois a cena gothic/dark, diferente de grande parte da cena underground, é em geral menos avessa aos diferentes tipos de cosmovisões religiosas.

Subgêneros do Metal

No post anterior já falei sobre as origens do metal e sua ligação com o cristianismo. Agora irei focar em cada subgênero, mostrando algumas bandas de cada subgênero.

Heavy clássico: as primeiras bandas cristãs do gênero foram Rez Band e Jerusalem, ainda que ambas na realidade fizessem mais um hard rock, mas já mais agressivo, em muitos momentos descambando pro heavy metal. Logo outras surgiriam, como 100% Proof, Saint, Messiah Prophet, Stryper (no início), Philadelphia e Barren Cross, além da precursora do speed metal cristão, Bloodgood.

Thrash metal: Seguindo a crista da onda dos anos 1980, várias bandas surgiram nessa época fazendo o som thrash, algumas vezes mais speed metal, noutras entre o thrashcore e o crossover também. Algumas das precursoras foram Tempest (não a de hard rock/heavy dos irmãos Rowe), Stone Vengeance (primeira banda de metal cristã só de negros), Have Mercy, Heaven's Force, Immortal (não a de black metal norueguesa, evidentemente), Realm, Deliverance e Vengeance Rising. Ainda houve algumas que faziam um som mais próximo do HC, seguindo uma linha crossover, como The Crucified, The Lead, Empty Tomb e Torn Flesh. Nos anos 1990, com a ascensão do Groove metal, vale a pena citar também bandas como Mortification, Slamcat, Godfear, Living Sacrifice e Soul Factor.

Power metal: Na linha clássica americana algumas bandas se destacaram, como Recon, Sacred Warrior, Haven, Eternal Ryte, e a provável precursora, Emerald. Já na linha mais alemã (melódica) do gênero, podemos destacar como precursoras as bandas Lightmare, Chrytzyne, Seventh Avenue e Stauros.

Industrial metal: Mortal Wish (não a brasileira de black metal, óbvio) foi a primeira banda a fazer um som assim no mundo cristão. A banda, que aposteriori mudaria de nome pra Mortal, antecipou essa cena que infelizmente é composta ainda por uma quantidade não muito extensa, tampouco conhecida de bandas, como Circle of Dust/Brainchild, Generation, Echelon High, Rackets and Drapes, Lvl, Klank, Virginia Creeper, X-Propagation, Screams of Chaos, Deitiphobia, Chatterbox, Kohllapse e Argyle Park/AP2.

Doom metal: Uma curiosidade nesse gênero é o fato de uma das primeiras do gênero ser também a primeira a ser chamada "white metal": Trouble. Embora não fosse de fato uma banda cristã, Trouble trazia muitas influências da fé cristã, visíveis em seus primeiros quatro discos principalmente. Infelizmente é um gênero de poucas bandas, como Faith, The Skull, Place of Skulls, Ex-Hortation, Virgin Black, Morphia, Incelência, 8-Ball Cholos, dbeality, Entorn, David Benson, Seventh Angel, entre outras. A mais importante delas sem dúvidas é a australiana Paramaecium, banda reconhecida até mesmo nos meios seculares.

Death metal: Algumas bandas como Vengeance Rising, Drop Dead e Creation of Death já tentavam fazer algo nesse sentido, mas só a Mortification conseguiu fazer um disco genuinamente death metal em 1992, com o clássico "Scrolls of the Megilloth", abrindo as portas para outras bandas nesse que é um dos estilos com o maior número de bandas cristãs. Algumas das mais importantes: Crimson Thorn, Antidemon, Corpse, Metanoia, Lament, Krig, entre outras.

Progressive e symphonic metal: As primeironas a fazer um som mais prog metal cristã foram Trytan, Sacred Warrior, Recon, Battalion e King's X (essa última não era declaradamente uma banda cristã, mas seus primeiros discos eram sem dúvidas cristãos). Logo surgiriam algumas mais elaboradas, na linha de bandas como Dream Theater e Symphonic X, caso de bandas como Titus, Darkwater, Harmony, Altera Enigma, Galactic Cowboys, Echo Hollow, Abstract Shadows e Menahem, entre outras. Já a trupe do symphonic tem menos representantes, como HB, Angel's Fire, Perpetual Legacy, Scandinavian Metal Praise, Lilium Vitae e Virgin Black (eles de novo? Pois é!).

Black metal: O termo "black metal" surgiu nos anos 1980 como designativo de "bandas do mal", "do diabo", etc. Não a toa foi nessa época que criaram o termo "white metal" pra designar as cristãs (termo geralmente rechaçado pela maioria atualmente). Daí quando o australiano Jayson Sherlock (Mortification, Altera Enigma, Paramaecium e várias outras) decidiu fazer um som similar ao que vinha da Noruega e Suécia, o Beheadoth (posteriormente com o nome mudado para Horde), ele criou o termo "Hellig Usvart" (Sacro Unblack), cunhando a expressão "Unblack Metal" (atualmente também pouco usada pela maioria do gênero). Algumas precursoras junto à Horde foram as pouco desenvolvidas Vomoth (também da Austrália) e Kolapso (Brasil) e a Apostasy (EUA), além das norueguesas Antestor (a mais famosa atualmente) e Crimson Moonlight. Também vale destacar algumas q seguiram subgêneros do black metal: no folk metal a Holy Blood, no viking metal a Arvinger, no vampiric metal a Satan's Doom (BR), no pirate metal a Cat 'O Nine Tails e no mid-eastern metal a Orphaned Land.

Nu e alternative metal: algumas bandas tentaram se aventurar nos primórdios desses gêneros, como a brasiliense Arcanjo, mas só a P.O.D. realmente virou referência. Aliás, baita referência, já que é reconhecida também no mercado secular. Além dessas vale a pena citar bandas como 38th Parallel, Red, Fold Zandura, Dig Hay Zoose, Skillet, Plumb, 2TM 2:3, The Throes, 12 Stones, East West, Pillar, Rodox, Thousand Foot Krutch, Disciple, Judas o Outro, Brian "Head" Welch, Verdade Crua, entre outras.

Metalcore e outras fusões core: A primeira a possivelmente fazer um som nessa linha foram as americanas Embodyment e Living Sacrifice, juntamente com as australianas Callous e Embodiment 12:14. Logo viriam outras bandas, como Underoath, As I Lay Dying, Retrieve, Alessa, Impending Doom, Sinai Beach, Still Remains, Betraing the Martyrs, August Burns Red, Bloodlined Callygraphy, Seventy Times Seven, Doomsday Hymm, Zao, Benea Reach, Training for Utopia, Demon Hunter, Forevertree, For Today, I Built the Cross, Inhale Exhale, Maylene and the Sounds of Disaster, The Showdown (que depois migraria pro doom/stoner metal), Improviso Divino, entre várias outras que tornam essa cena uma das mais profícuas da história da música cristã. Acredita-se inclusive que existem mais bandas cristãs ou com ligação com o cristianismo entre a turma do metalcore/deathcore/mathcore do que não-cristãos (!). Além disso a aceitação de várias delas pelo mercado secular é impressionante, tornando sem dúvidas essa trupe a mais frutífera de todas. A despeito do "modismo", o fato é que nenhum gênero gerou tantas bandas cristãs como esse.

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